Na contramão da expectativa de alguns sindicalistas, presidente do TST afirma que sindicatos não são ‘frágeis’ e precisam encontrar novas formas de financiamento
BRASÍLIA – O novo presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), João Batista Brito Pereira, defende que, com o fim do imposto sindical obrigatório, os sindicatos terão de se virar sozinhos. Na primeira entrevista desde que assumiu a instância máxima da Justiça do Trabalho, em fevereiro, o magistrado afirmou que as entidades que representam os trabalhadores terão de usar a “inteligência” para se financiar. “Eles precisam adotar medidas para sobreviver e são os trabalhadores que decidem (se querem contribuir com o sindicato ou não).”
A posição do novo presidente do TST vai na contramão da expectativa de alguns sindicalistas que esperavam apoio a uma eventual contribuição voluntária a ser regulamentada em lei. Na entrevista concedida ao Estadão/Broadcast, Brito Pereira defendeu a autorregulação e também rejeitou a avaliação de que há fragilidade nas entidades sindicais. A seguir, os principais trechos da entrevista.
A reforma trabalhista alterou profundamente a maneira com que os sindicatos são financiados. Sem dinheiro, algumas entidades até anunciaram corte de pessoal. O sr. está preocupado com o financiamento sindical?
Do mesmo jeito que me preocupo com fortalecimento da Justiça do Trabalho, também desejo o fortalecimento das entidades sindicais. Entidades sindicais de empregados e empregadores são, sem dúvida nenhuma, um dos pilares que sustentam a estabilidade das relações e, portanto, precisam ser fortes. Sem a arrecadação, eles podem não ser fortes. O que acontece é que a arrecadação está no seio da autocomposicao, da autogovernança, e sindicatos têm autonomia para isso.
Mas como garantir o financiamento nesse sistema de autogestão?
Pois é, isso é da inteligência das entidades sindicais. Está submetida apenas a eles (sindicatos) a autoridade e a autonomia. Não cabe a mim ou a quem quer que seja fazer juízo de valor sobre se estão bem ou se não estão bem. Eles precisam adotar as medidas legais e estruturais para sobreviver e são os trabalhadores que decidem. Se os trabalhadores decidem e o ambiente é livre, não vejo que se possa de longe censurar ou emitir juízo de valor. Eu quero ver a paz entre eles e, para isso, sindicatos são os bons atores.
Mas há reclamação. Será que falta engajamento do trabalhador?
O trabalhador já está bem ambientado com isso. Em qualquer cidade de médio ou pequeno porte, se vê sindicatos realizando assembleias no clube ou salão da igreja. A globalização levou o conhecimento de tudo. O sindicato de uma cidade pequena sabe as teses debatidas no ABC paulista. Estão muito orientados. E eu já não compreendo mais como é que se pode admitir que um sindicato é tão frágil na negociação. Não é. Os trabalhadores estão muito bem preparados e o Brasil precisa disso.
A Medida Provisória 808, que altera alguns pontos da reforma trabalhista, está tramitando, mas há percepção de que o governo poderia deixar o texto caducar. Se não for aprovada, há risco para a reforma?
Eu não vejo essa dificuldade. A MP é um instrumento constitucional que o presidente da República utilizou para ajustar a reforma e esses ajustes são bem-vindos. Se a MP for convertida em lei, alterará vários pontos da CLT, o que é bem-vindo porque o Congresso fará exame detido do texto. Se não converter (em lei) também não há perigo de essa norma, a CLT, perder força porque já é uma lei em vigor.
O TST debate a constitucionalidade do artigo 702 da CLT que muda o funcionamento do TST. Esse trecho é inconstitucional?
Essa ainda é uma questão a ser apreciada. Os colegas e eu estamos estudando e eu não tenho uma ideia conclusiva. E, ainda que eu tivesse (uma decisão), não seria dado a mim dizer porque o Tribunal ainda vai se debruçar sobre isso.
Mas e se o tribunal entender que é inconstitucional?
Se no Tribunal for suscitada a inconstitucionalidade, nós haveremos de enfrentá-la.
Especialistas dizem que, com a reforma trabalhista, o volume de processos deve cair. Se isso for confirmado, a Justiça do Trabalho será menor no futuro?
Posso lhe dizer que a população está aumentando. Portanto, a população trabalhadora está aumentando. E as demandas não vão parar. O que nós vamos fazer é mudar um pouco a cultura de, em casos de recursos repetitivos, nós não vamos julgar no ‘varejo’. Nós vamos reunir processos e definir a tese. Definida a tese, vamos julgar os demais recursos. É uma decisão vinculante. Essa mesma tese pode voltar ao Tribunal repetidas vezes, mas com nuances diferentes, novas circunstâncias. O Tribunal não perde a função de uniformizar a jurisprudência.
Fonte: Estadão