Mudança brusca do padrão de consumo na pandemia contribuiu para piora da situação, aponta economista da CNC
A pandemia fez com que o patamar de famílias endividadas operasse, em julho, acima da média nacional em 15 Estados, segundo pesquisa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), divulgada ao Valor. O quadro é menos favorável do que em junho, quando 14 Estados se encontravam nessa situação. No mesmo levantamento, a CNC apurou que, em julho, a fatia de famílias endividadas operou acima de média histórica em 22 Estados. Em junho, eram 21. A média histórica é calculada levando em conta o período pré-pandemia, entre janeiro de 2010 e março de 2020. O levantamento da CNC usou como base a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) da própria entidade, com universo de 18 mil famílias nos 26 Estados mais o Distrito Federal.
Para Izis Ferreira, economista da CNC responsável pelo levantamento, contribuíram para os resultados as bruscas mudanças nos padrões de consumo causadas pela crise da covid-19. É o caso do uso de cartão de crédito para compor renda entre mais pobres. Ao mesmo tempo, entre os mais ricos, poupança foi formada pela impossibilidade de realizar viagens ou contratar outros serviços, o que deslocou recursos para endividamento em financiamentos mais caros, de longo prazo. Como essas mudanças de padrão de consumo persistem, devido às restrições de circulação social, a heterogeneidade no perfil de endividamento das famílias por Estados deve continuar até fim da pandemia.
Izis disse que, em julho, a CNC apurou média nacional de parcela de 71,4% de famílias endividadas no país, no âmbito da Peic, maior percentual da série histórica iniciada em janeiro de 2010. O fato de tantos Estados se posicionarem acima dessa média já seria preocupante. Mas outro aspecto foi observado: a disparidade, entre Estados, de parcelas de famílias que se declararam endividadas.
Ela disse que, Estados de PIB per capita menor, como o Acre, mostrem maior parcela de famílias endividadas. No Acre, 92% de famílias declararam ter empréstimos a pagar. “O cartão de crédito tem muito a ver com isso” disse ela. Na Peic, a proporção de endividados no cartão de crédito renovou a máxima histórica no país, chegando a 82,7% do total de famílias com dívidas em julho. No Acre, essa parcela foi maior, de 84,7%. A técnica citou recente avanço da inflação, que diminuiu orçamento familiar. Agora, as famílias usam de estratégias para tentar fechar as contas, como é caso de uso de cartão. Além de ser Estado com mais elevada fatia de famílias endividadas, na pesquisa, a parcela registrada no Acre, em julho, também foi a maior da série histórica para aquele Estado.
Em contrapartida, Santa Catarina, com PIB per capita mais elevado, mostrou menor parcela de famílias endividadas, em julho, na listagem da CNC, com proporção de 50,9%, abaixo da média nacional e da média histórica para aquele Estado (78,3%).
A economista fez uma ressalva. Alguns poucos Estados, mais ricos, mostraram parcela expressiva de famílias endividadas em julho. É o caso de Paraná, com parcela de 91,1% em julho. “É claro que não podemos dizer que Paraná é um estado pobre”, afirmou ela. O Estado sempre operou com com patamar de endividado elevado, com média histórica em 88,4%. São famílias mais propensas a endividamento e com perfis de aquisição de maior porte, como imóveis e carros.
O levantamento sinaliza, ainda, aumento nas fatias de famílias endividadas nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro, de junho para julho. Nesse período, as parcelas de famílias que se declararam com empréstimo a pagar subiram de 64,6% para 66,1% em São Paulo; e de 69,2% para 72,6%, no Rio. Embora tenham permanecido abaixo da média nacional, essas parcelas estão acima das médias históricas para cada um desses Estados, respectivamente de 52,5% e de 62,3%.
Fonte: Valor Econômico