Uso limitado de dados pessoais dos consumidores e a experiência com a autorregulamentação ajudam empresas se adaptarem a nova legislação
Empresas que não cumprirem a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) já podem sofrer sanções administrativas e receber multas de até R$ 50 milhões. A fiscalização sobre o cumprimento das regras e punições começaram a valer no último domingo, 1, onze meses após a sanção da lei pelo governo. No entanto, ainda deve levar algumas semanas para que as punições sejam definidas pela Agência Nacional de Dados, órgão responsável pela fiscalização. Mesmo com novas regulamentações a serem formuladas, o setor de telesserviços segue na implantação da lei e utiliza o aprendizado com a autorregulamentação.
Para entender o efeito da legislação sobre o setor de telesserviços, que inclui os chamados call centers,a Bússola conversou com Cláudio Tartarini, sócio do escritório Souza Neto e Tartarini Advogados e assessor jurídico da Associação Brasileira de Telesserviços (ABT), que afirma que o escopo limitado de uso de dados pessoais dos consumidores e a experiência com a autorregulamentação ajudam as empresas do setor a se adaptarem a nova legislação. Veja abaixo trechos da entrevista.
Bússola: As sanções previstas na LGPD já podem ser aplicadas no caso de desrespeito às regras de proteção de dados pessoais. Qual o efeito sobre o setor de telesserviços, que inclui os chamados “call centers”?
Cláudio Tartarini: A LGPD é uma legislação complexa de proteção de dados pessoais que demanda investimentos e aperfeiçoamento de processos internos. A implantação da legislação é um desafio para qualquer setor da economia e para o próprio setor público. O setor de telesserviço enfrenta desafio similar, tendo investido valores relevantes para adotar processos e políticas internas que assegurem boas práticas de proteção de dados pessoais, como em segurança da informação, possibilidade de portabilidade e de procedimentos para anonimização de dados, entre outras mudanças para cumprimir as obrigações da LGPD.
Bússola: Por ser um setor que lida diretamente com os dados das pessoas, vocês estão mais vulneráveis a sanções e multas?
Cláudio Tartarini: Todas as empresas estão igualmente sujeitas à LGPD. Mas o setor de telesserviços acaba tendo um cenário um pouco menos complexo de implantação da lei. É menos complicado, pois em geral a atividade da empresa do setor é concentrada no uso limitado de dados de consumidores dos seus clientes corporativos, que são os fornecedores de produtos e serviços aos consumidores finais.
Esse uso de dados pessoais é restrito para reconhecer quem é o consumidor e outros detalhes do relacionamento com o cliente da empresa de call center. Por exemplo, no caso de serviço de call center de SAC, somente é necessário ter acesso a dados restritos do consumidor e que são necessários para esclarecer dúvidas, pedidos ou reclamações.
Já o risco relativo ao uso de dados pessoais pelos fornecedores diretos de serviços e produtos aos consumidores enfrentam aspectos mais desafiantes da aplicação da LGPD, em especial quando o negócio é focado no grande uso de dados dos consumidores, como em negócios da nova economia digitalizada. Portanto, o setor de call center tem riscos menores de violação à LGPD e menores chances de sofrer sanções e multas.
Bússola: As empresas do setor de telesserviços estão preparadas para a LGPD?
Cláudio Tartarini: O setor já é autorregulado há 15 anos pelo Código de Ética do programa de autorregulamentação do setor, chamado Probare. Este código tem regras que já previam a proteção de dados pessoais mesmo antes do debate em torno da LGPD ou mesmo do regulamento europeu no qual a LGPD se inspirou. Empresas que têm o Código de Ética do Probare passam por processos de auditoria que confirmam essas práticas de proteção de dados.
A existência desse compromisso ético do setor para a proteção de dados pessoais certamente contribuiu para as empresas estarem preparadas para a adaptação à LGPD. Em 2019, a ABT — Associação Brasileira de Telesserviços, junto com as outras duas entidades mantenedoras do Probare, promoveram a atualização do código de ética aos termos da LGPD, o que demonstra que aos menos empresas associadas destas entidades e que tenham o selo do Probare estão preparadas para promover as boas práticas de proteção de dados pessoais.
Fonte: Exame