Na crise, comprador migra para imóvel menor e longe do centro

Para tirar a mãe do aluguel, a analista contábil Mariana Menezes decidiu que era o momento de fazer um esforço. Há sete anos no mesmo emprego, a paulistana diz que a situação da empresa em que trabalha não é ruim, “o que dá uma tranquilidade” sobre a permanência dela no cargo que hoje ocupa.

No fim de 2016, resolveu adquirir a casa própria, um apartamento de dois quartos no bairro do Sacomã, próximo de onde as duas moram hoje. O empreendimento ainda está em obras. O valor financiado foi de aproximadamente R$ 300 mil.

— Eu trabalho no Itaim Bibi. São 13 km de carro e, dependendo do dia, levo até uma 1h30 para chegar. Adoraria poder comprar algo mais próximo do centro. Mas o que o meu orçamento permitiu foi esse.

Para a analista, hoje, o mais importante é saber que o dinheiro vai para um bem próprio.

— Eu e minha mãe sempre pagamos aluguel. É um dinheiro, que se eu olhar para trás não foi investimento, foi necessidade. Agora que tive a oportunidade, achei que foi um excelente negócio ter comprado esse apartamento, mesmo sendo longe do meu trabalho.

Comprar um imóvel na crise, com o fantasma do desemprego assombrando muita gente é arriscado. Mas quem tem uma relativa segurança e consegue o financiamento para a compra tem encontrado um cenário favorável.

O diretor da Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias), Luiz Fernando Moura, explica que, na crise, brasileiros em grandes cidades deixaram de lado o upgrade, deram espaço à necessidade e acabaram encontrando preços relativamente menores.

— Hoje, quem está comprando mais é o segmento econômico. É uma compra mais de necessidade. A maioria não está conseguindo ir para bairros mais valorizados e os lançamentos nessas regiões também diminuíram. O que tem ocorrido é que estão sendo construídos mais empreendimentos nas regiões periféricas, onde o terreno é mais barato e há condições de produzir para uma parcela da população que tem bolso para comprar.

Quem pretende adquirir a casa própria em 2017 ainda deve encontrar um cenário favorável, na opinião de Moura. Ele cita o índice Fipe-Zap, que monitora os preços de imóveis em 20 grandes cidades. Em 2016, houve queda real dos valores.

— Quem tiver condições, eu acho que é um momento muito interessante para comprar. Quando a economia voltar a crescer, a tendência é que aquele estoque de imóveis existente ainda consiga ser comercializado com os preços praticados hoje. A partir disso, haverá um repasse de inflação de custos.

Analisando números de lançamentos imobiliários em São Paulo e no Rio de Janeiro é possível ver a migração dos imóveis para outros bairros.

Confiança de construtoras e compradores ainda está longe do ideal

São Paulo

De 2014 para cá, novos prédios começaram a surgir em bairros antes pouco explorados na cidade de São Paulo. Exemplo desse movimento se dá no próprio centro (confira quadro abaixo).

A região da Consolação teve 1.436 unidades lançadas entre os meses de janeiro a outubro no período de 2010 a 2013, segundo o Secovi-SP (Sindicato da Habitação). Porém, a partir de 2014, esse número caiu para 496, sendo que neste ano, até outubro de 2016, não houve um lançamento sequer.

Por outro lado, uma região pouco explorada de 2010 a 2013 começou a receber mais empreendimentos. Em Santa Cecília, o número de novas unidades saltou de 296 para 1.774 nos últimos três anos.

O mesmo movimento aconteceu no distrito vizinho, a República. De 860 unidades lançadas (janeiro a outubro) entre 2010 e 2013, passou a ter 2.951 apartamentos novos. Na contramão, a região da Bela Vista, mais valorizada, caiu de 1.340 unidades para 448, nos mesmos períodos.

A zona leste é a que, historicamente, mais concentra empreendimentos imobiliários. Na Vila Prudente, de 2010 a 2013, foram lançadas 3.712 unidades, contra 1.322 nos três anos seguintes. Já na Penha, mais distante do centro, houve alta de 50% do número de apartamentos novos à venda. O mesmo aconteceu na Vila Matilde.

Localizado a cerca de 22 km do centro da capital, o bairro do Jaraguá, na zona norte, é mais um claro exemplo de como os novos empreendimentos migraram. A região teve apenas 372 novas unidades lançadas unicamente em 2012. Isso equivale a um grande condomínio. Mas de 2014 para cá, a oferta subiu mais de 50%.

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Terrenos mais baratos significam apartamentos que se encaixam no bolso de mais clientes. Segundo o Secovi-SP, 20,4% dos imóveis novos com valor inferior a R$ 225 mil foram comercializados no mês de outubro de 2016. Essa é, disparada, a faixa de preço mais procurada.

Quem sai em busca da casa própria em São Paulo tem dado preferência aos apartamentos de dois dormitórios. Em outubro do ano passado, foram vendidas 993 unidades. O tíquete médio desse tipo de imóvel é de R$ 365 mil.

As unidades mais lançadas ao longo de 2016 na capital paulista foram aquelas com tamanho entre 45 m² e 65 m². Porém, as unidades menores de 45 m² têm sido mais vendidas.

Rio de Janeiro

No Rio, até mesmo na disputada Barra da Tijuca diminuiu drasticamente o número de lançamentos. De 2010 a 2013, foram 8.439 novas unidades contra 1.656 de 2014 até outubro de 2016: queda de 80,38%. Os dados são da Ademi (Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário).

Próximo de lá, em Jacarepaguá, foram lançadas 13.275 unidades de 2010 a 2013 contra 4.781 nos três anos seguintes. A redução foi de 64% depois do início da crise.

Na Tijuca também houve menos lançamentos nos períodos em questão. As novas unidades caíram de 2.327 para 455.

Já bairros como o Andaraí (zona norte) e Realengo (zona oeste), que não tiveram qualquer lançamento de 2010 a 2013, receberam empreendimentos que somaram 209 e 975 unidades, respectivamente, desde 2014.

Em Santa Cruz, bairro localizado há mais de 60 km do centro da capital fluminense, o número de novas unidades cresceu 90%, de 2014 para cá, se comparado com o período de 2010 a 2013. Foram 1.360 unidades colocadas à venda nos últimos três anos.

 

Fonte: R7