A queda da inadimplência, a baixa dos juros e dos spreads e um aumento nas concessões em junho dão sinais, ainda que incipientes, de que o mercado de crédito ensaia recuperação na segunda metade do ano. A possível retomada, contudo, vem depois do pior primeiro semestre desde 2007, início da série histórica do Banco Central (BC), e de um mês de junho que, apesar de alguns indicadores melhores de confiança de empresas e consumidores, teve um raro recuo no estoque de financiamentos. Segundo o BC, uma queda no mês não era vista desde 2001.
Após uma escalada iniciada em janeiro, a inadimplência finalmente fez um movimento diferente e caiu de 3,7% em maio para 3,5% em junho. Houve redução nas taxas de calote tanto de empresas, que vinham puxando a alta, quanto das famílias. Segundo o chefe do departamento econômico do BC, Tulio Maciel, o movimento é explicado pelo aumento das renegociações de operações de crédito. “Ainda é prematuro dizer que houve mudança no comportamento da inadimplência, mas foi uma boa sinalização. ” Segundo Maciel, como o desemprego segue em marcha de alta, não é possível afirmar que há uma reversão de tendência.
Bruno Lavieri, economista da 4E Consultoria, diz que dois pontos merecem destaque na questão na inadimplência. Primeiro, que a queda foi generalizada. “Segundo, isso é especialmente difícil num momento em que o estoque de crédito está recuando, ou seja, o próprio denominador da inadimplência caminha contra”, diz.
Para João Morais, economista da Tendências Consultoria, o recuo da inadimplência das empresas é o componente que chama mais atenção, pois se encontrava em contínuo processo de elevação. Em maio, por exemplo, as empresas puxaram a alta dos calotes, com índice recorde de 3,2%, ante 3,1% um mês antes.
O BC apontou ainda que o crédito renegociado para pessoas físicas subiu 1,6% no mês e 18% em 12 meses, somando R$ 28,9 bilhões, nível recorde. O BC não tem estatística para as empresas, mas esse tipo de operação acaba sendo captada na rubrica “outros”, que teve alta 30% no mês, considerando recursos livres, para R$ 15,163 bilhões. A alta em 12 meses foi de 3,2%. Informações de mercado dão conta de que três grandes bancos montaram, nos últimos meses, áreas específicas para renegociar crédito de clientes corporativos.
Além disso, há operações de renegociação que são feitas sem esse nome, pois ocorrem para prevenir um calote em potencial. Há melhora também nos indicadores antecedentes. Os atrasos de 15 a 90 dias das pessoas físicas com recursos livres caiu 0,2 ponto percentual no mês, para 5,4%. Para empresas, a baixa foi a mesma, atingindo 5,1%.
Segundo Maciel, esse indicador mostra correlação com os spreads, já que a taxa de calote é um dos componentes desse indicador de custo do sistema financeiro. O spread médio cedeu 0,1 ponto no mês, para 22,7 pontos percentuais de diferença entre taxa de captação e de aplicação de recursos. Essa redução também refletiu na taxa de juros média do sistema, que cedeu 0,1 ponto percentual, para 32,6% ao ano. Já a taxa de captação se manteve em 9,9% ao ano no mês passado. No ano, a baixa é de 1,3 ponto percentual, mas a queda não foi repassada aos tomadores.
Morais, da Tendências, ressalta que a queda espalhada dos spreads pode significar dificuldade dos bancos de elevar preços, até mesmo pela escassez de demanda. “Pode ser que esse movimento de elevação dos spreads esteja próximo do fim”, diz.
Em junho, as concessões de crédito com recursos livres para empresas subiram 2,6%, para R$ 115,5 bilhões, no segundo mês consecutivo de elevação. Maciel disse que essa pode ser uma indicação, ainda muito incipiente, de retomada de empréstimos, tendo em vista a perspectiva de melhora da atividade econômica. No ano, as concessões caem 13,5%. Para as pessoas físicas, os novos créditos aumentaram 1,7%, também marcando o segundo mês de alta, para R$ 163,3 bilhões. A queda no ano é de 4,2%.
Dois vetores ajudam a explicar o movimento no mês, mas não servem como indicadores de tendência, devido à volatilidade. As concessões para crédito imobiliário a pessoas físicas subiram 4,1% em junho, somando R$ 7,455 bilhões. Para as empresas, destaque para a alta de 40,2% na concessão do BNDES, para R$ 6,751 bilhões. No ano, porém, as concessões do banco de fomento caíram 44,3% e o saldo da carteira encolheu 7%, a R$ 588,857 bilhões, algo não visto desde 2007, início da série. Em termos reais, aponta a Rosenberg, as concessões de empréstimos do BNDES caíram 49,5% no semestre, uma mudança significativa na postura do banco.
Em junho, o estoque de crédito caiu 0,5%, para R$ 3,130 trilhões. Desde 2001 não havia queda no saldo em meses de junho, pois esse período do ano marca a tomada de crédito para a produção no segundo semestre. Em proporção do PIB, o estoque representa 51,9%, o menor desde outubro de 2014. Em 12 meses, ele avançou 1%, patamar que é igual à previsão de crescimento feita pelo BC para o ano.
Em termos reais e excluídos os efeitos sazonais, diz Thais Zara, economista da Rosenberg, o quadro ainda é de desânimo. O saldo de crédito com recursos livres apresenta a vigésima sexta queda consecutiva na comparação com o mesmo mês do ano anterior, de 7,6%. Todas as modalidades estão em retração e nem mesmo o saldo de crédito consignado foi poupado. Para Thais, é difícil esperar melhora considerável da inadimplência com o mercado de trabalho encolhendo e taxas de juros elevadas. “Vamos precisar de mais tempo para ver se há melhora ou não. ”
Fonte: Blog Televendas