Pesquisa indica despreparo de líderes

Gestão de tempo mostra mais dedicação a rotinas e urgências do que para estratégias e desenvolvimento e acompanhamento de pessoas

 

Líderes corporativos gastam mais tempo com rotinas e urgências do que traçando os destinos estratégicos da área em que atuam e desenvolvendo pessoas, tarefas consideradas típicas de um líder. Essa conclusão é parte de uma pesquisa realizada pela Integração Escola de Negócios.

“Desenvolvemos esse tipo de trabalho para conhecermos o perfil da liderança, os dilemas e dificuldades que enfrentam, o que consideram relevante para apresentar desempenho, o que precisam e não têm e como eles veem os outros líderes com os quais trabalham”, diz o sócio-diretor da empresa, Fernando Cardoso.

No caso atual, o estudo ouviu 148 profissionais da indústria, serviços e comércio que exercem seus primeiros cargos de liderança. Os dados coletados mostram como eles distribuem seu tempo: 33% com a rotina diária, 26% com urgências, 22% com pessoas e 19% com o futuro, que se refere a estratégias de longo prazo. Mais dados da pesquisa estão no quadro abaixo.

Para Cardoso, esses porcentuais mostram que, apesar de o desenvolvimento de lideranças ganhar relevância constantemente, mesmo assim há um número razoável de pessoas que ascende profissionalmente sem nenhum preparo.

“O trabalhador assume a posição sem mudar seu modelo mental. Assim, entende que deve valorizar aquilo que o levou ao cargo. Só que esse modelo mental é de um cargo que ele deixou para trás, de um nível hierárquico abaixo, de um não líder. Então, acaba-se tendo líderes desempenhando papel de técnicos”, afirma Cardoso.

Para ele, temas comportamentais não são vitais para um técnico, já que ele não é um disseminador de modelos comportamentais, de clima, de relações. “Ele simplesmente tem de cuidar dele. E o líder tem de cuidar de milhares de questões que não são relacionadas a ele.”

Na análise de Cardoso, o líder assume o cargo, mas continua agindo como se ainda trabalhasse no setor operacional. “O que se percebe, isso é muito nítido, é que os líderes não delegam. Não têm claro que assumir um cargo de liderança significa que as coisas têm de ser feitas por outros. Há quem entenda que a dependência da equipe em relação a ele é sinal de liderança.”

Super-homem. Esses líderes, diz o diretor, são bem intencionados e acabam trabalhando mais do que as oito horas diárias, ficam conectados com a empresa full time. “Eles querem ser o Super Homem. Mas ser líder não é ser Super Homem, mas é ter uma equipe de Super Homens.”

Daí a necessidade, defende Cardoso, de as organizações terem políticas de gestão de talentos, para formar líderes para cada nível de liderança. “E formar significa pactuar com eles quais vão ser suas novas atribuições, que é onde está a lacuna.”
Sem esse preparo, os profissionais assumem o posto sem entender que o holofote não deve estar nele, mas na equipe, argumenta o diretor da Integração. “Tudo isso se reflete na maneira como ele administra seu tempo. Uma consequência disso é o baixo desempenho.”

Na opinião de Cardoso, o ideal seria que o tempo fosse distribuído ao contrário do que o quadro da pesquisa revelou. Ou seja, com mais tempo para futuro e pessoas, com rotinas e urgências por último. “O trabalho do líder é olhar para frente.”
A própria pesquisa ainda revela que o principal desafio dos líderes é desenvolver pessoas, em primeiro lugar, e a gestão de mudança em segundo lugar.

Diretor da Fortes Tecnologia de Sistemas, Clavius Tales diz que já enfrentou esse quadro quando se tornou líder. Com o tempo foi percebendo que havia algo errado em suas prioridades, pois se dedicava pouco a assuntos estratégicos.

A solução adotada por Tales foi simples, mas exigiu determinação e persistência. Passou a dedicar um tempo diário apenas para questões estratégicas, de futuro. Começou com uma hora diária e foi ampliado. Nesse período, ficou acertado que ninguém na empresa poderia interrompê-lo. “Deviam agir como se eu não estive lá, como se estivesse de férias”, conta.

Com o tempo, ele foi ampliando as horas que dedicava a essa atividade. “O curioso é que nesses períodos em que ninguém poderia me interromper, falar comigo, as pessoas começaram a tomar decisões que não podiam ser adiadas”, lembra. “E na grande maioria das vezes eles acertavam. E basicamente foi isso: uma adequação da minha agenda. Não foi nada muito elaborado.”

Apesar de a situação tê-lo deixado mais confiante em delegar, Tales diz que seu estilo de gestão sempre foi muito participativo e colaborativo. “Eu dificilmente tomava uma decisão isolado. As decisões sempre foram compartilhadas.”

Tales entrou como estagiário na Fortes em 1992, ano em que a empresa do Grupo Fortes de Serviços iniciou suas atividades. “Fui evoluindo (profissionalmente) e hoje sou sócio.”

A Fortes Tecnologia tem 600 funcionários e desenvolve softwares para contabilidade, seu principal produto, transportadoras e para empresas em geral. Neste caso, são soluções financeiras, de contas a pagar, de R.H., entre outras. Já a Integração Escola de Negócios é um núcleo de capacitação de profissionais nos níveis de gerência, supervisão e analista fundado em 1966.

Fonte: Estadão