Crise política pode afetar recuperação da economia brasileira, dizem especialistas

Mercados entraram em pânico após denúncias contra o presidente Michel Temer; há dúvidas sobre aprovação da reforma da Previdência e manutenção do ritmo de corte da Selic.

A crise política pode afetar a recuperação da economia brasileira, afirmaram especialistas ouvidos pelo G1. Após a delação dos donos da JBS afirmando que gravaram o aval do presidente Michel Temer para comprar o silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), os mercados entraram em pânico na manhã desta quinta-feira (18), com o dólar cotado acima de R$ 3,40, e a Bovespa chegou a interromper os negócios depois de cair mais de 10%.Esse cenário trouxe incertezas quanto ao andamento das reformas da Previdência e Trabalhista, que estão em análise no Congresso. Até mesmo o ritmo de queda da taxa Selic, a taxa básica de juros da economia, pode ser afetado pelas incertezas na economia e política, de acordo com os especialistas.

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Segundo Alexandre Wolwacz, diretor técnico da L&S Investimentos, a crise política trouxe consequências econômicas violentas e somente após a resolução disso será possível saber a direção da economia no país. “Essa situação gera uma incerteza sobre a política econômica. Não sabemos se vamos continuar reduzindo as taxas de juros, se vamos respeitar a meta de inflação ou se vamos conseguir gerar empregos”, ressalta.

“A agenda de reformas fica praticamente inviabilizada, a própria manutenção do governo é incerta e isso afeta também a retomada dos investimentos, a principal variável por trás da expectativa de retomada da economia”, diz Silvio Campos Neto, economista da consultoria Tendências. Diante desse cenário, segundo ele, a queda do desemprego também fica mais distante.

Para Alex Agostini, economista-chefe da Austin Ratings, os acontecimentos políticos afetam a economia em curto, médio e longo prazo, e precisam de resolução para o andamento do mercado. “É importante ter o conhecimento dos fatos o mais breve possível para que os agentes econômicos determinem suas expectativas e atuem”, afirma Alex Agostini, economista-chefe da Austin Ratings.

“Essa crise coloca praticamente em terra qualquer chance de reforma e ainda põe em dúvida a permanência do Temer”, avalia Chico Pessoa, economista da LCA Consultores.

Taxa Selic

Campos Neto, da Tendências, acredita que, caso a volatilidade do mercado se prolongue, o Banco Central pode reduzir o ritmo de queda ou até mesmo estagnar a taxa Selic. “Se o dólar continuar subindo ao longo das próximas semanas, chegando a R$ 3,60, R$ 3,80, o estrago inflacionário pode ser grande e o governo vai ter que ser mais cauteloso [em relação ao corte da taxa básica de juros]”, explica.

O corte na taxa Selic é embasado no ritmo de queda da inflação. Se o dólar sobe muito, o índice geral de preços acaba sendo afetado, já que muitos itens da economia têm insumos importados.

Por outro lado, Alex Agostini, economista-chefe da Austin Ratings, acredita que a Selic não deve ser afetada, na próxima reunião em maio, e a empresa projeta corte de 1 ponto percentual. Para as próximas reuniões, o especialista diz que o Banco Central vai analisar os acontecimentos para determinar se o ritmo será mantido. “O BC já acompanhava a sustentabilidade de economia e como a reforma da Previdência foi colocada em dúvida, isso coloca a sustentabilidade do equilíbrio fiscal em dúvida e as chances de reduzir a taxa depende dessa aprovação”, afirma.

Rating

Sobre a nota emitida pelas agências de classificação de risco para o país, Neto diz que uma redução não é provável no curto prazo, mas a expectativa de recuperação do rating não deve se concretizar, segundo Campos Neto.

De acordo com Agostini, da Austin Ratings, as incertezas políticas que afetam a economia também impactam de forma negativa a percepção de melhora no rating, já que a aprovação da reforma da Previdência era considerada uma das etapas para melhorar o grau de investimento do país. “Isso é ruim porque mantém a limitação de investidores internacionais no Brasil”.

Incertezas no mercado

A LCA espera uma maior taxa câmbio, uma queda menor na taxa de juros e um ritmo menor de crescimento do PIB. “Já a inflação vai depender do comportamento das variáveis aumento do câmbio e queda da atividade econômica”, diz Pessoa.

“O mercado não gosta de incerteza. Se ele fica com medo, ele busca proteção e essa proteção normalmente vem no dólar”, afirma Pessoa.

Sobre a abertura da Bovespa em circuit breaker, um mecanismo de controle de variação dos índices, Wolwacz, da L&S Investimentos, disse que isso pode ser considerado um fato raro. “Não tínhamos visto isso nem em 2008. É um fato histórico dentro da bolsa brasileira”, ressalta.

Indefinição sobre Temer

A indefinição sobre a permanência de Temer coloca em cheque não só a aprovação das reformas, mas a continuidade da política econômica, incluindo a gestão de estatais como a Petrobras, que tem capital aberto, segundo Pessoa. “E se vem alguém (um novo governo) que muda a política e congela os preços da Petrobras de novo?”, avalia Pessoa.

“As perguntas que estamos fazendo agora, considerando o cenário da queda do Temer como o mais provável, é: tem eleição direta ou indireta? A equipe econômica fica até ele sair? Quem vai ganhar vai mantê-la?”, questiona Pessoa.

As quedas da Petrobras, Banco do Brasil e Vale nas bolsas ao redor mundo também foram impactadas pela incerteza do comando no Brasil, já que se houver uma troca de governo, a tendência é que essas empresas tenham troca de gestores e o mercado se antecipa a prováveis mudanças. “Essas alterações podem impactar futuras decisões e o mercado age para se proteger de possíveis perdas”, afirma Agostini.

Segundo Pessoa, se a equipe econômica de Temer continua no comando do país, ainda que a reforma da Previdência não seja aprovada, outras políticas como o controle do caixa, o aumento dos impostos, a PEC do teto dos gastos e as concessões a privatizações são mantidas, acalmando os investidores.

Fonte: G1 Economia