Construção de unidade de processamento de gás já provoca até disputa entre municípios
Desde setembro do ano passado, quando a Petrobrás anunciou o consórcio vencedor da licitação para construir a Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN) do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) em Itaboraí (RJ), milhares de desempregados ocupam diariamente as calçadas de dois pontos da cidade: o sindicato dos trabalhadores do setor e o escritório da Shandong Kerui e Método Potencial, responsáveis pela obra e contratações.
Eles sabem que as vagas só devem surgir no segundo semestre. “Mas a gente tem de vencer pelo cansaço. Quem não é visto não é lembrado”, disse Herivelton Frazão, de 47 anos, sem trabalho formal há três anos. No início da noite da sexta-feira passada, ele e mais sete homens permaneciam sentados na calçada em frente ao escritório do consórcio construtor da unidade de gás, no centro da cidade, à espera de um milagre.
O grupo conta que a estratégia nos últimos meses tem sido ficar disponíveis caso alguém apareça na porta do escritório para oferecer uma vaga. Por isso, chegam cedo, por volta das 6h da manhã, e só saem no fim do dia, às 20h. Alguns se mantêm nas calçadas de domingo a domingo, por 24 horas, como o ajudante de obras Sérgio Luiz de Souza Filho, de 26 anos, pai de quatro filhos e há dois anos sem trabalho. “Ficar dentro de casa não adianta nada.”
Eles só deixam o local no início das tardes para caminhar até a porta do Sindicato dos Trabalhadores de Manutenção e Montagem Industrial do Município (Sintramon) e se informar sobre possíveis novidades. “Não tem vaga para todo mundo. Tem de ficar em cima”, afirmou Artur Ribeiro, de 37 anos, formado em administração, com experiência em departamentos de recursos humanos de empreiteiras.
A notícia de que uma única unidade produtiva vai ser instalada no Comperj desencadeou também a batalha das prefeituras de Itaboraí e de municípios vizinhos – principalmente Niterói e São Gonçalo – e do sindicato pelas vagas que vão surgir. Presidente do Sintramon, Paulo César dos Santos Quintanilha conta que foi até o canteiro de obras para reclamar com uma empresa contratada pela Petrobrás por ter empregado cinco trabalhadores de Minas Gerais. Sem revelar o nome da prestadora de serviço, disse que têm sido recorrentes as conversas de conscientização da importância de contratação local, principalmente dos demitidos das obras do Comperj nos anos de 2014 e 2015.
Contingente. No auge da atividade, em 2011 e 2012, 38 mil chegaram a ser empregados, dos quais cerca de 500 permanecem para tomar conta do que restou, segundo o sindicato. A expectativa, no entanto, é de que o número de vagas geradas com a unidade de gás não ultrapasse 5 mil, contingente previsto para 2019. “Estamos discutindo muito para não ter invasão em Itaboraí. Tem muita gente sem trabalho nas cidades vizinhas por causa dos estaleiros que foram fechados. As empresas (contratadas pela Petrobrás para as obras no complexo petroquímico) falam em aderir”, disse Quintanilha.
Gerente de Implantação do projeto UPGN/Rota 3 da Petrobrás, Frederico Doher alega que a petroleira não pode interferir na decisão de quem suas fornecedoras vão empregar. Mas aposta que os desempregados do Comperj terão prioridade.
A avaliação do prefeito de Itaboraí, Sadinoel Souza (PMB), é que famílias de várias partes do País já chegam à cidade desde o ano passado, com o anúncio da retomada. Ainda assim, o prefeito comemora que parte do gás natural do pré-sal seja processado na cidade a partir de 2020. A projeção é que, apenas no período de construção da unidade, até 2020, a arrecadação de ISS pule para R$ 150 milhões. Em 2017, foi de R$ 3 milhões.
“Mas a geração de renda é o que tem impacto, o trabalho indireto”, disse. Para dar uma dimensão da crise, o prefeito conta que tomou a decisão de nunca pagar o salário dos servidores públicos numa quinta ou sexta-feira. Assim, evita que o dinheiro gerado no município abasteça a economia de outras cidades. “Hoje temos uma violência em Itaboraí jamais imaginada. Com a retomada das obras isso vai melhorar. Vamos conseguir empregabilidade.”
Fonte: Estadão