Por que é tão difícil para o endividado encontrar o caminho de volta para a estabilidade financeira? Não há como negar que o desemprego que atinge quase 13 milhões de pessoas, a queda da renda, os juros elevados, tudo isso se traduz em barreiras para um saneamento das finanças e justificam em boa parte a dramática situação do brasileiro.
Mas levar em conta apenas esses elementos pode levar a um diagnóstico incompleto e ao fracasso das tentativas para reequilibrar o orçamento. A solução vai além de planilhas, dos cálculos, de números ou considerações técnicas, e deve passar necessariamente pelo comportamento das pessoas.
Acostumada a ouvir relatos de seus clientes sobre dificuldades financeiras, a especialista em Desenvolvimento Humano, Rebeca Toyama, entendeu a necessidade de tratar o assunto com essa nova abordagem, considerando fatores comportamentais e culturais.
Segundo ela, não fomos preparados para planejar ou tomar determinadas iniciativas, ao longo da vida. Ao contrário, são funções que acabam por ficar sempre a cargo de outras instituições. “Desde pequenos, aprendemos o que é certo ou errado, pela Igreja, depois esperamos que a saúde e a educação venham do Estado e, em seguida, que empresa em que trabalhamos assuma esse papel”.
Ao apoiar-se nessas expectativas, é natural que diante de um aperto financeiro em caso de demissão ou quando a renda se reduz drasticamente na aposentadoria, a responsabilidade seja atribuída exclusivamente à empresa ou à Previdência Social, respectivamente. São situações que poderiam ser enfrentadas com mais tranquilidade se houvesse um planejamento para a formação de uma reserva financeira ou de uma aposentadoria complementar, exemplifica a especialista.
Ela lembra que as pessoas estão vivendo mais, até os 90 anos, e trabalhando até os 60, e a questão é como sobreviver por mais 30 anos e bem, com qualidade. “Mas nem todos têm essa consciência e se preocupam em um planejamento para a nova realidade”. Especialmente quando se tem a perspectiva de uma reforma previdenciária que poderá tornar mais difícil o acesso à aposentadoria oficial, ou quando, em meio a uma economia ainda anêmica, a probabilidade de perder um emprego é bem grande.
Esse distanciamento da realidade é apontado pela consultora também em circunstâncias mais triviais como, por exemplo, em dívidas no cartão de crédito. É fato que os juros do rotativo são pesados, mas o controle dos gastos tem de ser do consumidor. Existe uma etapa anterior ao do endividamento e incapacidade de pagamento em consequência do alto custo dinheiro, quando é preciso gastar de acordo com as possibilidades. “Tudo se passa como se não fosse o próprio consumidor que fez as despesas”.
Rebeca reconhece que não faz parte da nossa cultura, para a grande maioria das pessoas, pensar em um planejamento e se preparar para o casamento, para o nascimento do primeiro filho, nem a para troca de casa. A tendência é ir contraindo a dívida, gerando boletos, para depois descobrir como vai pagar.
E a saída?
Antes de se dedicar a um planejamento técnico propriamente dito, contabilizando entradas e saídas de dinheiro para sair do atoleiro, é fundamental reconhecer que o endividamento não é uma situação normal. “Não faz sentido uma pessoa dizer que isso é normal só porque há muita gente nessa mesma situação. É preciso admitir que isso é um problema”, adverte Toyama.
Não menos importante é a pessoa se conscientizar de sua capacidade de reverter o quadro. “Ela precisa acreditar que é possível mudar, e que ela é capaz de fazer uma transformação”.
No passo seguinte, o endividado precisa chamar para si a responsabilidade de seus problemas financeiros. “Não podemos simplesmente apontar os juros altos, ou o patrão que demite, como causas das dívidas, é preciso assumir a sua participação”. A especialista explica que só assim o consumidor pode conseguir o controle da questão. Há um problema sério por trás disso, “porque as pessoas estão desconectadas delas mesmas”.
Até aí houve uma preocupação maior com o aspecto psicológico do problema. Isso porque, segundo a consultora, quando chega em busca de ajuda e orientação, o endividado não traz informações racionais do problema, mas com uma carga emocional expressiva. O mesmo acontece no momento das decisões. “Já está comprovado por pesquisas que uma pessoa não toma decisões de forma racional, com a cabeça, e sim com o domínio das emoções, com o coração”.
Portanto as soluções também devem percorrer esse mesmo caminho, a técnica se torna insuficiente, com necessidade maior do entendimento do ser humano. “Como vou entender a pessoa que está na minha frente se não conheço a mente humana, o que é ponto cego, ou modelo mental?, questiona ela.
A especialista afirma que quando o encaminhamento é alicerçado no Desenvolvimento Humano, a pessoa pode até conseguir descobrir algo maior, como, por exemplo, qual o seu propósito na profissão ou até mesmo na vida.
Toyama se utiliza da psicologia transpessoal para suas análises, orientações e formação de profissionais como planejadores financeiros, pela Academia de Planejamento Financeiro Gfai. O curso é destinado a quem já têm familiaridade com os assuntos relacionados a finanças, seja por ter construído sua carreira no próprio mercado financeiro, ter atuado nos setores de seguro ou de previdência privada, ou por já ser um gestor de patrimônio.