Propostas para ‘limpar nome’ são vistas com receio nos bancos

As propostas de candidatos à Presidência para renegociar dívidas em atraso de pessoas físicas são vistas com um misto de receio e descrédito nas instituições financeiras. Executivos do setor temem a volta do uso político dos bancos públicos e consideram a medida insuficiente para fomentar a concessão de financiamentos.

Nas últimas duas semanas, o Valor conversou com fontes de bancos sobre as propostas de Ciro Gomes (PDT) e Fernando Haddad (PT) para equacionar o endividamento das famílias. A medida aparece nos programas de campanha como forma de estimular o crédito e o consumo. Os demais postulantes ao Planalto não apresentaram sugestões desse tipo.

Para o executivo de uma grande instituição financeira, um programa de renegociação de dívidas por meio dos bancos públicos “custaria uma fortuna”. Mais que isso, diz, a conta acabaria indiretamente sendo paga pela sociedade.

Fonte de outro banco pondera que uma ação para limpar o nome de pessoas que estão no cadastro negativo de birôs de crédito pode ser insuficiente para estimular a oferta de empréstimo. “Esse não é o único fator que se olha para aprovar um crédito”, diz. Também entram na conta, segundo ele, o apetite do banco por diferentes linhas, a renda disponível

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O presidente do Banco do Brasil (BB), Paulo Caffarelli, fez comentários nessa mesma linha há pouco mais de uma semana. Questionado por jornalistas sobre a proposta de Ciro, o executivo disse que, para os bancos, a capacidade de pagamento do tomador pesa mais que o fato de ter ou não restrições cadastrais. “Toda análise de crédito de uma instituição

Na ocasião, Caffarelli disse ainda que o BB é regido por “fortíssima governança corporativa”. Sob o mandato de Dilma Rousseff (PT), o Banco do Brasil e a Caixa adotaram uma política de juros baixos que afetou a rentabilidade e os índices de capital dessas instituições.

Um executivo do setor avalia que uma medida para renegociar dívidas em atraso poderia ter como efeito colateral estimular a inadimplência. “As pessoas poderiam esperar nova ação”, diz.

O professor da FGV-SP Nelson Marconi, assessor econômico de Ciro, afirma que esse risco não existe. “Não me parece que as pessoas vão se endividar para ter desconto, até porque vai pegar dívidas até uma determinada data, não será permanente”, observa. Para o economista, “algo errado parece ter acontecido” quando 63 milhões de pessoas se endividarame entraram no cadastro negativo. Sob o Programa Nome Limpo, o candidato do PDT pretende renegociar e parcelar essas dívidas.

Segundo Marconi, o programa não será restrito a bancos públicos. Os privados poderão participar e o professor diz acreditar que eles terão interesse em negociar créditos inadimplentes ou baixados para prejuízo. Os juros, porém, serão regulados.

Marconi rechaça a possibilidade de prejuízo para os bancos estatais e os cofres públicos. Se necessário, as instituições poderão “captar recursos mais baratos”, para casar ativos e passivos. Ele não exemplifica que fontes seriam essas.

A campanha de Haddad não retornou, até o fechamento desta edição, pedido do Valor para detalhar as propostas do candidato petista. O plano de governo fala na criação do programa Dívida Zero, “que prevê a instituição de linha de crédito em banco público com juros e prazo acessíveis” para pessoas que estão no cadastro negativo do SPC e da Serasa.

Outra proposta de Haddad é criar um sistema de tributação com alíquotas menores para quem oferecer taxas de juros mais baixas e prazos mais longos. O programa não detalha de que forma isso seria feito.

A medida desperta críticas entre executivos do setor, que consideram inviável uma tributação progressiva dos spreads. Para um interlocutor, a proposta “não tem racional”. Outro considera difícil colocá-la em prática. “Como vão saber qual é o meu spread?”

Em reunião com analistas há três semanas, o presidente do Itaú, Candido Bracher, disse que tributação não parece ser uma medida “particularmente eficaz” para reduzir os spreads bancários no país. “É desejo da sociedade inteira e também dos bancos a redução dos spreads. Permitiria conceder mais crédito, reduzir inadimplência, melhorar a qualidade do crédito. Só tem vantagens”, disse, ao ser questionado sobre as propostas dos candidatos. “Mas não é coisa que você faça com canetada.”

Haddad tem afirmado que conversou sobre a proposta com o presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn, e ele teria dito que a vê “com bons olhos”. Segundo o petista, não haverá aumento da carga tributária.

Os demais presidenciáveis não apresentaram propostas para renegociar dívidas em atraso ou tributar spreads elevados. Todos, no entanto, falam em aumentar a concorrência aos bancos, como mostrou reportagem publicada pelo Valor em 4 de setembro.

Ciro, Haddad, Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede) citam o estímulo às fintechs como um caminho para uma competição maior. O candidato tucano também prevê a implementação do cadastro positivo para reduzir o custo do crédito a pessoas físicas e pequenas empresas. Líder nas pesquisas, Jair Bolsonaro (PSL) não faz menção a bancos e crédito em seu programa.

Procurados, BB, Bradesco, Itaú Unibanco, Santander e Caixa não se manifestaram. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) afirmou que não comenta planos de governo dos candidatos.

Fonte: Valor econômico