Estudo da Anbima aponta que população denomina como investimento compra de carro e de bens duráveis
Ainda não foi em 2018 que o investimento caiu na graça dos brasileiros. Pesquisa obtida com exclusividade pelo Estado, realizada pela associação das empresas do mercado financeiro, a Anbima, revela que apenas 8% da população economicamente ativa conseguiu guardar algum dinheiro para aplicação no ano passado.
O número é muito distante daquele captado pela própria Anbima no início do ano passado, quando mais da metade dos entrevistados – 56% – revelou o interesse em poupar nos 12 meses seguintes.
Na prática, além da baixa adesão, o levantamento evidencia uma certa confusão em torno da noção do que é ou não é uma aplicação financeira. Quando questionados apenas se ao longo de 2018 realizaram algum investimento, 25% dos entrevistados disseram que sim. No entanto, instigados a detalhar o destino desses recursos, 17% relataram aportes em bens duráveis, como carros e imóveis, reformas residenciais e até a abertura de uma pequena empresa.
Mesmo entre os 8% que efetivamente destinaram recursos para produtos do mercado financeiro, o estudo aponta para uma baixa diversificação. Dos entrevistados, 5,6% optaram pela caderneta de poupança como opção de investimento, um produto que, no ano passado, acumulou retorno de 4,55% ao ano, ante 15% da Bolsa de Valores.
Para a pesquisa da Anbima foram realizadas 3.452 entrevistas em todo o Brasil, distribuídas em 152 municípios com a população economicamente ativa, inativos que possuem renda e aposentados das classes A, B e C, a partir dos 16 anos. A margem de erro é de dois pontos porcentuais para mais ou para menos, com nível de confiança de 95%.
Mercado distante
Para os responsáveis pelo levantamento, os dados sinalizam o quanto o mercado financeiro ainda está distante do dia a dia do brasileiro. E isso acontece por dois motivos: falta de educação financeira e uma dificuldade real em conseguir guardar dinheiro em meio a uma crise econômica persistente.
“Quando um entrevistado diz que investiu na compra de um carro, isso acontece porque, para ele, tudo aquilo que pode se transformar em um bem-estar no futuro é identificado como investimento”, diz a superintendente em educação financeira e informações técnicas da Anbima, Ana Claudia Leoni, uma das responsáveis pelo estudo.
Ana Claudia é do time dos que enxergam na falta de cultura de investidor o principal motivo pelo baixo número de investidores.
Segundo ela, além de não saber ainda onde colocar o dinheiro, o brasileiro não quer guardar dinheiro. “Entre poupar ou consumir, ele prefere consumir. O brasileiro trabalha o mês inteiro e ainda não vê valor em colocar o que resta do dinheiro em uma aplicação. Vai preferir comprar alguma coisa”, destaca Ana Claudia.
“Não interessa o tamanho da torneira, mas, sim, do ralo. Se fosse diferente, não teria como explicar países com PIB per capta mais baixo que o Brasil, mas com população com mais dinheiro investido”, afirma ela.
Atrás no ranking
Relatório de 2018 do Fundo Monetário Internacional coloca o Brasil como o segundo pior país em taxa de poupança per capita da América do Sul. A relação entre PIB e recursos investidos aqui é de 14,6%, à frente apenas da Venezuela, com índice de 13,1%. O país que lidera o ranking é o Equador, com 24,7%, seguido pelo Paraguai, com 22,6%.
Para a especialista em finanças domésticas Angela Nunes, da Planejar, não dá para descartar o pouco tino do brasileiro com o mercado de investimento, mas, ressalta ele, “realmente há parcela importante com dificuldade financeira para guardar dinheiro”.
De acordo com Angela, dos 8% que pouparam alguma coisa, 71% afirmaram terem conseguido isso por meio de contingenciamento das despesas domésticas. “E entre os mais pobres, tem uma parte que não tem conhecimento ou tem dificuldade em poupar”, afirma ela.
Ricos e pobres
Na opinião do gerente de projetos da empresa de pesquisa Plano CDE, Breno Barlach, o brasileiro, em todas as faixas sociais, sofre de uma cultura imediatista, que dificulta o hábito de investimento.
“Essa cultura indifere de classes sociais. Entre os 40% mais pobres no Brasil, 6% poupam pensando na velhice, versus 17% da mesma condição social na América Latina. Entre os 60% brasileiros mais ricos, também 6% poupam pensando na velhice, enquanto são 15% na América Latina”, afirma Barlach.