Desoneração da folha gera empregos, como Guedes quer? Nem sempre

Estudo concluiu que a desoneração setorial e temporária de Dilma não gerou empregos. Agora, governo quer tentar desoneração horizontal e focada nos jovens

São Paulo — O ministro da Economia, Paulo Guedes, está convencido de que uma desoneração na folha de pagamentos de trabalhadores formais vai incentivar a criação de novas vagas no mercado.

Ninguém discorda do fato de que o custo da contratação é alto no Brasil. Por esse ângulo, a ideia do governo faz sentido, uma vez que, na teoria, as contratações formais ficariam mais baratas.

Mas é um gatilho óbvio para a geração de empregos?

“A resposta é não”, diz Marcos Lisboa, presidente do Insper. Para o economista é muito mais provável que as empresas façam ajustes internos, como aumento de salários de quem já está na empresa, ao invés de fazer novas contratações. “É o novo equilíbrio de mercado. A tal concorrência funciona”, explica.

Lisboa cita um estudo feito pelo economista Jonathan Gruber a respeito do efeito de política semelhante feita no Chile, que já foi citado como modelo pela equipe econômica de Guedes no âmbito da discussão da reforma da previdência.

Gruber mostrou em sua pesquisa que a redução da alíquota previdenciária total ocorrida na reforma chilena não teve impacto sobre o nível de emprego, mas sim sobre os salários dos já empregados.

No Brasil, a estratégia de desoneração da folha tem sido mencionada em dois contextos. Um deles é em meio à discussão sobre reforma tributária.

Nessa esteira, a intenção da equipe econômica é substituir a contribuição patronal de 20% para o INSS sobre a folha de pagamento por um novo imposto sobre transações financeiras chamado de Contribuição sobre Pagamentos (CP) e frequentemente comparado à extinta CPMF.

Mas a desoneração da folha também vem sendo citada como um aspecto da criação de uma “carteira verde-amarela”, discutida na campanha, mas sumida desde o início do ano.

No novo plano, revelado por veículos de imprensa nos últimos dias, o foco estaria em beneficiar os mais jovens que, na comparação entre faixas etárias, são os que mais sofrem para encontrar um emprego.

Nesse modelo de contratação alternativo, o trabalhador teria menos direitos em relação a um funcionário registrado pela CLT, mas sua folha de pagamento custaria menos em contrapartida.

Direitos trabalhistas previstos na Constituição, como décimo terceiro salário, fundo de garantia e férias remuneradas, continuariam inalterados.

Para Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, a política pode fazer sentido se for concentrada na parte mais jovem da população.

“Pode ser interessante, mas muito bem feito para que não haja simplesmente uma troca de empregados mais velhos por mais novos por conta do benefício tributário”, afirma.

Dilma também desonerou

Não é a primeira vez que um presidente tenta a estratégia de desonerar com o objetivo declarado de gerar empregos.

Em 2011, a presidente Dilma Rousseff retirou para alguns setores a contribuição de 20% ao regime de previdência incidente sobre a folha de salários das empresas. Em contrapartida, os empregadores passariam a contribuir à previdência com alíquotas entre 1% e 2% incidentes sobre a receita.

Em maio de 2014, poucos meses antes da eleição, a política se tornou permanente. Mas em 2015, já com Joaquim Levy à frente da Fazenda, ela começou a ser revista em meio à crise.

Em 2018, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) analisou o impacto da desoneração e concluiu que não houve efeitos da política sobre o volume de empregos.

“Não é claro e direto o efeito sobre o nível de emprego de uma política de desoneração da contribuição patronal à previdência”, escreveram os economistas responsáveis pelo estudo – entre eles Adolfo Sachsida, hoje secretário de Política Econômica do Ministério da Economia.

Outro autor do estudo do Ipea, Felipe Garcia, professor da Universidade Federal de Pelotas, pondera que um problema foi o fato de a política da petista ter sido temporária e direcionada somente a alguns setores, o que tirou a potência da desoneração em termos de geração de emprego. 

“Todas as medidas que vão na direção de diminuir esses custos e desonerar os encargos que incidem sobre a folha tendem a estar na direção correta”, defende Garcia.

De acordo com o documento do Ipea, as despesas das empresas na contratação de trabalhadores não são de natureza única. Isso importa porque uma política de desoneração da folha coloca várias opções na mesa para as empresas.

Apenas uma delas é a contratação de mais trabalhadores, o que repercute em maiores despesas de todas as naturezas (fixas, quase-variáveis e irrecuperáveis). Outra é a ampliar a jornada dos trabalhadores já empregados com horas extras, o que repercute apenas em maiores custos variáveis.

Uma crítica frequente, feita inclusive por Dilma anos depois da sua política de desoneração, quando disse que se arrependera da medida, é a de que empresas se apropriaram dos valores, aumentam seus lucros e não investem no aumento de produção.

Sergio Vale, da MB, destaca que o problema do alto desemprego não é só uma questão de custo. “Hoje falta confiança e demanda para justificar maior emprego”, diz. A estimativa da MB é que o desemprego só chegue a um dígito no final deste governo.

Fonte: Exame.com