Foco das fintechs é população de baixa renda moradora de comunidades pobres
Cerca de um terço dos adultos em todo o mundo, ou 1,7 bilhão de pessoas, não tem conta corrente, de acordo com estudo da consultoria global Capco. No Brasil, a parcela de usuários fora do setor bancário caiu de 30%, em 2017, para 16% em 2021. Para acelerar esse ritmo, segundo a análise, as fintechs podem funcionar como portas de entrada no sistema financeiro.
“A digitalização [dos serviços] é fator chave para a inclusão financeira no Brasil, principalmente por conta da extensão territorial, que limita a quantidade de agências bancárias para atendimento”, diz Aline Lemos, consultora da Capco Brasil. “Ao mesmo tempo, temos em média dois celulares para cada brasileiro e os bancos digitais já alcançaram boa parte do público.”
O ano de 2021 terminou com 18.302 agências no país, 2.351 a menos do que o registrado no início de 2020, conforme dados do Banco Central. Números da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) de junho de 2022 mostram que o Brasil acumula 259 milhões de celulares, uma densidade de 120,6 aparelhos por cem habitantes. “Essa estrutura digital também torna o serviço financeiro mais barato”, lembra.
Na opinião de Alexander Albuquerque, fundador do Banco Maré, criado em 2017 para atender moradores de comunidades carentes, estabelecer parcerias tanto com fintechs como com atores tradicionais do sistema financeiro pode azeitar o acesso a serviços para quem mais precisa. Recentemente, o Maré fechou dois contratos para ampliar operações: com a Mastercard, na distribuição de cartões; e com a GB Pay, fintech que viabiliza pagamentos de boletos em até 12 vezes.
Fundada no Complexo da Maré, da zona norte do Rio de Janeiro, a instituição acumula 27 mil clientes, ante 23 mil em julho de 2021, em cinco Estados. Uma das ferramentas de inclusão usadas é o microcrédito baseado na avaliação do “score social”. “O ‘score’ é um algoritmo que criamos para definir o grau de vulnerabilidade social do usuário”, explica. “Ter acesso ao crédito com uma análise mais humana faz toda a diferença para o nosso público.” Noventa por cento dos clientes do Maré moram em comunidades e 67% ganham até R$ 2 mil mensais. De acordo com Albuquerque, pelo menos 8% da base de cadastros obtiveram crédito pela primeira vez.
Na QueroQuitar, que funciona como um marketplace de negociação de dívidas, o interesse é oferecer as melhores condições financeiras para saldar contas em atraso. No mercado desde 2015, reúne 40 grupos credores, como a operadora Vivo e a varejista Renner, e acumula 57 milhões de devedores – eram 30 empresas e 44 milhões de pagantes em 2021, segundo o CEO e fundador Marc Lahoud.
Mesmo com o auxílio emergencial do governo federal, 74% dos usuários não utilizaram essa renda para negociar notas vencidas, diz Lahoud, que atua com o sócio-fundador Artur Zular. Pesquisa realizada pela startup com 850 pessoas que ajustaram dívidas nos dois últimos anos sinaliza que 24,8% sofreram com a perda total de renda durante o pico da pandemia.
Sobre os tipos de encargos mais negociados, o levantamento aponta que são os débitos de cartão de crédito, citados por 63,8%; antes de empréstimos bancários (28,1%) e faturas de cartões de lojas (22,7%).
No passado, o devedor era procurado ostensivamente pelos cobradores, analisa Lahoud. “Surgimos para mudar isso, com o usuário podendo analisar uma dívida com calma, olhando as melhores ofertas, em qualquer hora do dia, em um processo 100% digital.”
Na Firgun, fintech que facilita operações de microcrédito para empreendedores de grupos minorizados, principalmente mulheres, negros e a população de baixa renda, o número de beneficiários avançou de 350 para 550, entre julho de 2021 e julho de 2022.
No modelo adotado, o objetivo é oferecer o microcrédito como serviço (MaaS, na sigla em inglês). “Empresas nos contratam para desenvolver linhas de crédito para moradores de uma região específica, de forma a colaborar com metas de sustentabilidade”, explica o CEO Fábio Hideki. O plano é alcançar um volume de empréstimos de até R$ 1 milhão até o final do ano.
Fonte: Valor Econômico