Reabertura maior da economia e continuidade da expansão do crédito para pessoas físicas puxam movimento
As vendas do varejo nos segmentos mais dependentes do crédito reagiram em abril e registraram, no acumulado em 12 meses, crescimento de 2,9%, a primeira taxa positiva por essa comparação desde março do ano passado, segundo cálculos da XP Investimentos. A recuperação veio após o pior momento desde a crise, em fevereiro, quando o setor atingiu retração de 7,9% em 12 meses, queda que abrandou para 5,1% no mês seguinte. Na comparação mensal, houve salto de 17,7% entre março e abril, com ajuste sazonal, bem acima do desempenho do varejo movido à renda, que subiu 0,5%.
O movimento foi puxado pela reabertura maior da economia, a despeito das contaminações e óbitos por covid-19 ainda em nível elevado, e a continuidade da expansão do crédito para as pessoas físicas. No curto prazo, a expectativa é que, depois de um ano operando de forma descolada, os grupos do varejo ligados à renda e ao crédito voltem a caminhar em ritmo mais parecido.
Pela métrica calculada pelo IBGE, divulgada na semana passada, o varejo restrito subiu 1,8% de março a abril, a maior taxa para o mês desde 2000, enquanto o conceito ampliado (que inclui veículos e material de construção) registrou alta de 3,8%.
“As concessões reais de crédito têm observado um desempenho relativamente favorável, apesar da alta da taxa Selic no período mais recente. Além disso, muitos desses segmentos têm correlação muito forte com a mobilidade da população. Em abril já tínhamos observado relaxamento das restrições de contato social e isso se intensificou em maio e junho”, afirma Rodolfo Margato, economista da XP Investimentos.
Segundo o Banco Central (BC), as concessões de crédito para as famílias cresceram 10,2% de março a abril, com ajuste sazonal, enquanto o saldo das operações de crédito, também para consumidores, subiu 1% no período.
A análise em 12 meses evidencia que, dentro do varejo ligado a crédito, a venda de material de construção acelerou de 16,1% para 21,1% em abril, enquanto a de móveis e eletrodomésticos foi de 10% para 16,4%. E mesmo aqueles setores que mais sofreram durante a crise reduziram parte das perdas acumuladas, como veículos (de -12,8% para -3,7%) e tecidos e vestuário (-24% para -15%).
O economista lembra que, ainda que o comércio eletrônico tenha ganhado espaço na pandemia, parte relevante do movimento ainda depende das lojas físicas. “Alguns segmentos ainda têm um pouco mais para avançar. Vestuário e calçados ainda estão em níveis muito deprimidos e a demanda por esse tipo de produto acaba aumentando com a afrouxamento das restrições de mobilidade”, afirma Margato.
Em meados do segundo semestre e em 2022, no entanto, o varejo ligado ao crédito deve começar a desacelerar e perder ímpeto ante o consumo dependente de renda. “A produção e as vendas de bens de consumo duráveis devem perder fôlego, em parte por causa do aperto das condições monetárias”, afirma o economista. Anteontem, o BC aumentou a taxa Selic em 0,75 ponto percentual, para 4,25% ao ano.
Já o varejo dependente da renda deve sustentar o ritmo de alta, apesar de inflação persistente ter tirado poder de compra das famílias. “Vamos observar nas próximas leituras mensais do varejo a contribuição do retorno do pagamento do auxílio emergencial, que voltou em abril e começou a ganhar tração em maio”, diz Margato, lembrando que o governo já prevê que a medida seja estendida até setembro ou outubro.
O benefício deve compensar a fraqueza no mercado de trabalho. “Os salários têm tido um desempenho bem modesto, mas o auxílio ajuda a ampliar a massa de renda das famílias.”
Além do consumo de bens essenciais, como alimentos nos supermercados, certo alívio deve vir do mercado de trabalho, ainda que em marca lenta de recuperação. “Mesmo que não se espere grande melhora no mercado de trabalho, o emprego deve voltar ao nível pré-pandemia em meados do ano que vem. E, com a reabertura da economia, isso acaba puxando a população ocupada e os empregos informais. A massa de renda efetiva obtida pelo trabalho deve ter crescimento, embora em cima de base de comparação fraca”, afirma.
A ajuda à melhora do nível emprego também deve ocorrer pela volta dos serviços prejudicados pelo distanciamento social. “O que falta se materializar de forma mais clara, e isso deve ocorrer no segundo semestre, é a volta dos serviços prestados às famílias, que deve ser sentida melhor a partir do terceiro trimestre”, diz Margato.
Fonte: Valor Econômico