A possibilidade de resolver a maior parte da vida financeira via celular, fora de horário comercial, com um gerente de prontidão do outro lado da tela é o benefício mais visível da transformação digital do sistema financeiro do Brasil. Mas a mudança que facilitou a vida dos clientes trouxe também ganhos expressivos de eficiência porta giratória adentro e explica por que os grandes bancos vêm apostando tão alto na digitalização de suas interações com correntistas.
Banco do Brasil, Itaú Unibanco, Bradesco e Santander traduzem em números os ganhos trazidos pelo modelo de atendimento digital. No BB, os clientes atendidos pelos canais eletrônicos têm uma margem de contribuição – que mede o consumo de produtos e serviços do banco – 40% superior à dos clientes “analógicos” do banco. No Itaú, o índice de eficiência – relação entre despesas e receitas – de uma agência digital é entre 10 e 15 pontos percentuais melhor que o do ponto de atendimento físico.
O que diferencia o modelo digital de atendimento bancário do tradicional? Embora as minúcias da resposta variem de banco para banco, em linhas gerais a grande diferença é que o gerente responsável pelo cliente não fica mais localizado em uma agência de rua tradicional, mas sim em uma espécie de escritório.
No lugar do relacionamento face a face, as conversas são todas por telefone, videoconferência ou mensagens eletrônicas. O próprio pacote de serviços contratado incentiva o cliente a ir o mínimo possível à agência, com limites maiores de transferência on-line, por exemplo. Ou seja, nem todo correntista que utiliza o celular para usar o banco é considerado um cliente digital.
Não existem números consolidados sobre a quantidade de clientes exclusivamente digitais, mas dados da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) mostram a relevância do uso da internet e do celular nas transações bancárias. Em 2015, 54% dos 54 bilhões de transações bancárias feitas no Brasil se deram por meio de aplicativos ou do internet banking. E banking. Em 2014, foram 47%.
Um dos grandes atrativos dos modelos digitais é a expansão do horário de atendimento. Em evento recente, André Sapoznik, diretor-executivo do Itaú Unibanco, reconheceu que o horário normal de funcionamento das agências bancárias – das 10h às 16h – hoje é restrito demais para um grande contingente de clientes. No modelo digital, o horário expandido – das 7h às 24h – permite uma “reconexão” do banco com o cliente. “Essa conexão se traduz em mais negócios. Antes o gerente não encontrava o cliente”, afirmou.
O Itaú vai encerrar o ano com 1,73 milhão de clientes digitais dentro dos segmentos de alta renda Personnalité e Uniclass. A meta do banco para 2017 é aumentar esse número em 27,4%, para 2,2 milhões. Se as receitas com venda de produtos são maiores, os custos com esse modelo também acabam sendo menores para o banco. “O atendimento é feito a partir de um escritório, que é muito mais barato do que ter um ponto na rua, em um local de alta visibilidade”, diz o executivo. É por causa dessa combinação que o índice de eficiência da operação digital é superior ao da física.
A migração de clientes para o modelo digital é um dos alicerces do plano de reformulação da rede de atendimento do Banco do Brasil, anunciado em novembro. O BB vai fechar 402 agências, transformar outras 379 em postos mais simplificados e abrir 255 unidades digitais de atendimento – hoje, existem cerca de 245. O plano do banco é ter, em 2018, capacidade para atender digitalmente 4,5 milhões de clientes – a totalidade de seus clientes de varejo de alta renda. Hoje, o BB tem 1,3 milhão de clientes digitais.
Segundo Raul Moreira, vice-presidente de negócios de varejo do BB, há duas vias simultâneas de digitalização de clientes da instituição. A primeira, mais ampla, envolve estimular o uso do aplicativo de celular por toda a base de clientes do banco. “As agências têm meta a cumprir de clientes que usam canais digitais”, disse.
A segunda frente, concentrada num segmento de renda maior, envolve a migração completa do correntista para um modelo digital de atendimento. Hoje, a faixa-alvo desse modelo tem renda mensal de pelo menos R$ 4 mil. Como o custo para atender clientes nesse modelo é menor que no mundo físico, o BB já planeja a criação de um novo segmento de atendimento digital, de renda a partir de R$ 2 mil. “Esse modelo dá ao banco mais capacidade operacional para segmentar o atendimento.”
A experiência do Bradesco com a digitalização dos clientes oferece um contraponto ao que têm feito os concorrentes. O banco da Cidade de Deus também está convidando seus clientes de maior renda – Prime e Exclusive – a se digitalizar. O banco oferece horários estendidos de atendimento a esses clientes e tarifas mais baixas.
Mesmo com essas vantagens, em média, só 25% dos clientes aceitam migrar a conta para o modelo digital. “Mesmo usando o celular para fazer as operações bancárias, a referência de uma agência onde ele possa encontrar o gerente ainda é importante para o nosso cliente”, diz Josué Augusto Pancini, vice-presidente do Bradesco. Isso não significa que a digitalização não seja prioridade dentro do banco, que calcula em 34% a economia de custos no modelo de atendimento remoto.
O Bradesco tem hoje duas “plataformas digitais” – que, na prática, são grandes escritórios de funcionários – em São Paulo que atendem seus clientes digitais nas regiões Sudeste e Sul. O plano para 2017 é abrir mais quatro plataformas Brasil afora e oferecer a possibilidade de todos os clientes de alta renda migrarem para o modelo digital. “Para clientes de até R$ 2 mil de renda mensal, a oferta digital não se rentabiliza”, afirma.
O Santander optou por um perfil de clientes diferente dos demais bancos para dar início ao atendimento digital. Na primeira fase, ofereceu a migração da conta para correntistas dos segmentos Van Gogh – com renda entre R$ 4 mil e R$ 10 mil – e de micro e pequenas empresas.
O banco possui hoje 300 mil clientes no modelo e a meta para o ano que vem é, no mínimo, dobrar esse número, com a extensão da oferta para os clientes do segmento Select (alta renda), afirma Cassius Schymura, diretor da plataforma multicanal do Santander.
Mesmo com o aumento esperado da base de clientes digitais, o plano do banco não é diminuir os canais tradicionais, mas mudar o perfil desse atendimento, segundo o diretor. Ele citou o exemplo do call center, que a partir de 2017 passará a ficar integrado ao mesmo modelo de atendimento das agências. “Queremos que o call center comece a ter uma maior interação com o cliente”, afirma.
Fonte: Valor Econômico
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