Com apetite fraco para emprestar diante dos sinais ainda instáveis da economia, os maiores bancos privados brasileiros decidiram destinar uma parcela maior de seus lucros bilionários aos acionistas. No ano passado, Itaú Unibanco, Bradesco e Santander pagaram R$ 22,2 bilhões em dividendos, o que representa mais da metade do resultado das instituições no período.
Mesmo com a queda nos lucros em consequência da crise, o valor destinado aos acionistas foi 14% maior que o de 2015. A situação é bem diferente dos bancos públicos, que precisaram reduzir os dividendos.
O movimento que simboliza essa estratégia foi tomado pelo Itaú. O maior banco privado brasileiro remunerou seus acionistas em R$ 10 bilhões, líquido de impostos, o equivalente a 45% do lucro recorrente no ano passado. O banco já informou que pretende pagar pelo menos 35% do resultado aos acionistas neste ano, acima da média de 31% praticada desde a fusão entre Itaú e Unibanco, em 2008.
A explicação para o aumento no pagamento de dividendos é simples: com a retração do crédito e lucros vultosos mesmo em um contexto de crise, os bancos passaram a trabalhar com “capacidade ociosa” no balanço. Como não veem oportunidades para usar esses recursos adicionais na concessão de financiamentos ou em alguma grande aquisição, as instituições optaram por distribuir esse dinheiro aos acionistas.
Embora possuam ações listadas em bolsa, Itaú, Bradesco e Santander são “bancos de dono”. Isso significa que parte relevante desse dinheiro foi para o bolso dos controladores. No caso do Itaú, os principais acionistas detêm 47% do capital e 91% das ações com direito a voto.
Trabalhar com excesso de capital representa perda de eficiência para os bancos. Pelos cálculos do Goldman Sachs, o Itaú teria um ganho de 1,8 ponto percentual na rentabilidade se operasse perto do nível de capital de 12% estabelecido como ideal pelo presidente do banco, Roberto Setubal.
No fim do ano passado, o Itaú tinha um índice de capital de 15,8%. Nesse patamar, o banco teria hoje condições de ampliar o crédito em mais de R$ 200 bilhões ou fazer uma aquisição com volume próximo a R$ 30 bilhões, segundo Carlos Macedo, analista do Goldman Sachs. “Excesso de capital é um bom problema, mas não deixa de ser um problema”, afirma.
Das três maiores instituições privadas, o Bradesco é quem se encontra com menos folga no balanço, em razão da incorporação do HSBC Brasil. Mesmo assim, pagou aos acionistas quase R$ 7 bilhões em dividendos, o que representa 46% do lucro contábil do ano passado.
Na época do anúncio do negócio, pelo qual pagou R$ 16 bilhões usando apenas recursos em caixa, o banco chegou a anunciar um aumento de capital no fim de 2015, mas depois cancelou a operação. “Os bancos conseguiram proteger bem a rentabilidade na crise e os ativos cresceram pouco”, diz Eduardo Rosman, analista do BTG Pactual.
Nesse cenário, a expectativa é que o Bradesco consiga recompor o capital nos próximos anos sem precisar mexer nos dividendos. Os controladores da instituição possuem aproximadamente 74% das ações com direito a voto e 38% do capital total.
O Santander Brasil é proporcionalmente o banco mais generoso na distribuição do lucro aos acionistas. As subsidiárias do banco espanhol, incluindo a brasileira, costumam pagar 50% do resultado em dividendos, considerando o padrão internacional (IFRS). Na contabilidade brasileira, o banco distribui quase 100% do lucro anual aos acionistas – a matriz espanhola possui hoje quase 90% do capital do banco no país.
O aumento no pagamento de dividendos reflete a perspectiva dos bancos privados de que a economia oferece hoje poucas oportunidades de negócios rentáveis, mas também sinaliza que o pior ficou para trás, segundo Claudio Gallina, diretor da área de instituições financeiras para o Brasil da agência de risco Fitch.
A expectativa da agência é de um crescimento entre 4% e 5% do crédito neste ano, ou algo próximo de zero descontando a inflação do período. Embora o crédito permaneça fraco, as despesas de provisão contra calotes, que pesaram nos balanços nos últimos dois anos, devem começar a cair em 2017. “Ao distribuírem mais dividendos, os bancos não anteveem maiores problemas na economia”, afirma Gallina.
Os bancos privados também se aproveitaram da distribuição de dividendos para pagar menos imposto no ano passado. Isso porque a distribuição de juros sobre o capital próprio (JCP), uma das formas de as empresas remunerarem seus acionistas, é dedutível de imposto de renda.
No ano passado, o espaço para empresas e bancos pagarem juros sobre o capital próprio ficou ainda maior, em razão da alta da taxa de juros de longo prazo (TJLP), de 6,25% para 7,5% ao ano. A taxa de referência dos empréstimos do BNDES também baliza o quanto as empresas podem distribuir de JCP – quanto mais alta, maior o limite.
Fonte: Valor Econômico