A 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou a apreensão de um automóvel financiado pelo Banco Volkswagen, por meio de alienação fiduciária (no qual o próprio bem é a garantia do pagamento), mesmo já tendo o consumidor quitado a maior parte da dívida. O comprador já havia pago 44 das 48 parcelas.
O julgamento representa um importante precedente, principalmente para os bancos de montadoras, que têm sofrido condenações do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) baseadas em uma nova tese denominada de “adimplemento substancial”. De acordo com ela, se o consumidor já tiver pago boa parte da dívida – mais de 80% – e conseguir comprovar que aquele bem é essencial, caberia uma execução menos gravosa
O processo analisado pelos ministros do STJ envolve a compra de um Gol City 1.0, modelo 2010. O total de R$ 14 mil seria pago em 48 parcelas de R$ 439. As quatro últimas prestações, porém, deixaram de ser quitadas, o que gerou uma dívida de R$ 2.052. Por esse motivo, a instituição financeira solicitou a busca e apreensão do bem.
Ao julgar o caso na quarta-feira, o relator, ministro Marco Buzzi, entendeu que a busca e apreensão de bens seria medida desproporcional, quando já ocorreu boa parte do cumprimento do contrato. No entanto, a maioria dos ministros (seis a dois) seguiu o voto divergente do ministro Marco Aurélio Belizze.
O ministro entendeu ser “absolutamente imprópria a invocação da teoria do adimplemento substancial (não prevista em lei, mas que seria um consectário do princípio da boa-fé contratual, insculpido no artigo 422 do Código Civil), como fundamento idôneo a afastar o legítimo direito de ação do credor fiduciário de promover a busca e apreensão do bem”.
Segundo o magistrado, não há que se falar em aplicação subsidiária do Código Civil já que existem leis específicas que tratam do tema. Um exemplo é o Decreto-lei 911, de 1969, que em sua redação original, previa a possibilidade de o credor fiduciário, desde que comprovada a mora ou o inadimplemento, valer-se da medida judicial de busca e apreensão do bem, o que foi mantido pela Lei nº 13.043, de 2014.
Para Belizze, a aplicação da teoria do adimplemento substancial nesses casos seria um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais.
O ministro destacou ainda que a 2ª Seção do STJ já decidiu em recurso repetitivo que deveria haver o pagamento integral da dívida em contrato de alienação fiduciária, sob pena de restituição do bem ao devedor. O tema não é exatamente igual ao que foi julgado agora, mas na época os ministros também julgaram no mesmo sentido.
Um advogado de instituição financeira que preferiu não se identificar afirma que o novo julgado do Superior Tribunal de Justiça deve frear uma nova indústria de ações revisionais que vinha afetando consideravelmente os bancos de montadoras.
Para ele, se a tese do adimplemento tivesse sucesso no STJ poderia encarecer o crédito, dificultar o acesso de pessoas a novos financiamentos de veículos e aumentar a recusa de bancos por novos contratos que tivessem algum risco de inadimplência.
Segundo o advogado Ricardo Amaral Siqueira, do escritório RSSA Advogados, que defende consumidores, apesar da decisão da 2ª Seção, a discussão ainda não se esgotou porque não foram analisados critérios como o valor da dívida diante do total do contrato e a essencialidade do bem.
“Em um dos processos que obtive decisão favorável no Tribunal de Justiça de São Paulo comprovamos que se tratavam de caminhões de uso diário da empresa e sua apreensão a prejudicaria ainda mais, o que dificultaria a quitação”, diz.
Procurado pelo Valor, o Banco Volkswagen informou que não teria porta-voz para falar sobre o tema. O consumidor do processo analisado no STJ não tinha advogado nomeado nos autos.
Fonte: Blog Televendas