Um dos erros mais comuns quando o assunto é finanças é ter dinheiro guardado e, ainda assim, contrair uma dívida. Muitos endividados possuem algum tipo poupança e se recusam a usá-la para quitar as contas. Dizem: “não posso usar este dinheiro: é para pagar a faculdade do meu filho”, ou então “estou poupando para a minha aposentadoria, não posso fazer um resgate para pagar a fatura do cartão”.
Racionalmente, o equívoco parece óbvio. Não faz sentido manter uma aplicação na poupança, que rende cerca de 5,25% ao ano, ou em um título do Tesouro Direto atrelado à taxa Selic, que fica perto de 7% ao ano, enquanto a dívida no cartão de crédito avança com uma taxa de juros de 221% ao ano. É tentar conter o rompimento de uma represa a conta-gotas.
No entanto, o erro persiste – e o que a teoria economia clássica não consegue compreender encontra resposta na economia comportamental. O vencedor do Prêmio Nobel de Economia deste ano, Richard Thaler, explica o fenômeno com o conceito de contas mentais: criamos “etiquetas” separadas para o uso do dinheiro para fins específicos. Desta forma, não podemos usar a verba da faculdade dos filhos para pagar a fatura do cartão de crédito.
Estas “etiquetas” nada mais são do que orçamentos. Trata-se da velha técnica do envelope: separar o dinheiro que ganhamos em diversos envelopes ou contas, cada um com uma finalidade específica, para garantir que haverá o suficiente para pagar todas as despesas da família até o final do mês.
“A existência dos orçamentos pode violar um princípio fundamental da economia: o dinheiro é fungível (grifo do autor), o que quer dizer que não tem etiquetas que restrinjam onde pode ser gasto”, reflete Thaler. O economista comportamental vê neste princípio uma lógica poderosa: “Se sobra dinheiro no orçamento da conta de eletricidade porque o inverno foi suave, ele pode ser gasto perfeitamente na loja de sapatos para criança”.
O dinheiro que uma pessoa ganhou no trabalho é o mesmo que o que veio como um prêmio da loteria, ou mesmo de uma herança. Ainda assim, olhamos para eles de formas diferentes. No caso acima, dá dívida e da poupança, o dinheiro que era destinado para a educação dos filhos precisa ser utilizado para quitar a dívida do cartão de crédito, para evitar que ela cresça a uma velocidade exponencial. Esta é a atitude racional a ser tomada – mas são poucos os que conseguem fazê-lo. Afinal, a sensação que dá é de punir os filhos pelos seus próprios excessos cometidos no cartão.
No livro “Comportamento Inadequado”, Thaler cita um estudo realizado pelos economistas Justine Hastings e Jesse Shapiro, que buscavam entender o que acontecia com o comportamento do consumidor quando surgia uma economia inesperada. Eles estudaram o que aconteceu em 2008, quando o preço da gasolina caiu cerca de 50% nos Estados Unidos. Segundo a teoria econômica clássica, os consumidores passariam a ter uma “sobra” no orçamento que poderia ser utilizada da forma que preferissem. Contudo, não foi isso que aconteceu.
Hastings e Schapiro verificaram que durante a crise, quando a maior parte das famílias americanas estavam tentando economizar onde foi possível, o único item que não sofreu cortes foi justamente a gasolina. Com a queda dos preços, os motoristas decidiram passar a utilizar uma gasolina de melhor qualidade. Ou seja: aquele dinheiro que poderia ir para qualquer outro tipo de despesa ficou confinado na mesma categoria.
Se você está com uma dívida e tem um dinheiro guardado, seja para qual objetivo for, o certo é usá-lo para quitar a dívida o quanto antes. Esta é uma verdade universal em todos os casos onde a taxa de juros do seu investimento for menor do que a taxa da dívida. Mesmo sendo algo dolorido, o correto é zerar a dívida e depois voltar a poupar com consistência. A dor estará lá, mas você pode tomar a atitude mais racional, sabendo que esta é a melhor estratégia para o seu bolso.
Fonte: G1 Economia