Os sinais de crescimento ainda são tímidos, após um período de profunda retração no mercado de crédito, que não poupou nenhuma linha. Mas o microcrédito volta a entrar no foco de algumas grandes instituições financeiras, que têm reformulado sua forma de atuação e ampliado investimentos no segmento, especialmente na área tecnológica.
A expansão das concessões no microcrédito começou a reagir em novembro passado, quando atingiu R$ 902 milhões, alta de 1,5% em relação ao mesmo mês de 2016. Já o saldo total da carteira do segmento encerrou novembro em R$ 4,67 bilhões, recuo de 5,8% no ano. Segundo analistas, a queda da taxa básica Selic – que saiu de 14,25% para os atuais 7% ao ano, sua mínima histórica – deve favorecer uma demanda maior pelos financiamentos daqui para frente. O problema é que o microcrédito ainda não sentiu este esperado efeito: a taxa média na modalidade para o microempreendedor foi de 30,28% para 29,51% em 12 meses até novembro, segundo dados do Banco Central.
Um dos entraves apontados por analistas para o setor é o custo mais elevado para atrair clientes, que se reflete em uma baixa lucratividade, além dos acanhados tíquetes das operações, que começam com valores muito pequenos, oscilando entre R$ 500 e R$ 2 mil – mesmo que o limite que pode ser emprestado nessa modalidade seja de R$ 60 mil. A inadimplência no segmento, segundo os grandes bancos, tem girado em torno de 5%.
“O mais caro é a prospecção de clientes. Ter uma boa base de clientes é dispendioso”, afirma João Rabelo Junior, diretor de governo do Banco do Brasil. Uma solução encontrada pelas instituições é a de manter o cliente ativo, oferecendo mais empréstimos. “Você não faz uma única operação com ele, faz sete, oito. A partir da terceira já começa a ter lucro, você recupera o custo da primeira”, diz.
Para tentar diminuir custos e aumentar a rentabilidade, os bancos têm apostado na tecnologia. O Santander – maior entre os privados no segmento, com 8,5% de “market share” – vai começar a oferecer tablets com diversas funcionalidades para os agentes de crédito, possibilitando que os profissionais façam a negociação com novos clientes através do aparelho, sem a necessidade de ir até a agência, além de fazer simulações das condições do empréstimo eletronicamente.
O banco ainda instituiu um modelo de remuneração variável para os agentes, em que eles oferecem outros serviços, como abertura de conta e maquininhas de cartão da Getnet a preços especiais. Conforme o cliente contrata outros produtos, o pagamento do agente cresce. Segundo Tiago Abate, superintendente do Prospera – braço do banco voltado apenas para essa linha de crédito -, cria-se um sistema em que “todos saem ganhando”.
“É bom para o agente, que aumenta sua remuneração; é bom para o banco, porque quanto mais clientes, mais ganha. É bom para o próprio cliente e também para a sociedade, já que há um incentivo para a economia local”, afirma o executivo.
Se o mercado ainda patina, o Santander tem apresentado bons resultados na modalidade. Entre janeiro e outubro de 2017, o banco concedeu R$ 630 milhões em microcrédito, o que representou aumento de 28% em relação ao mesmo período de 2016. O objetivo do banco para os próximos anos é atender a todas as regiões do Brasil – atualmente, o produto está disponível em 12 Estados – e ajudar a fazer esse mercado crescer. Abate conta que os clientes do microcrédito ficam em média oito anos renovando a linha.
O Banco do Brasil também está em fase de aprimoramento e investimento no setor. Com o objetivo de contratar mais de 450 mil operações em 2018, o banco também pretende investir mais em tecnologia – possibilitando a negociação para a contratação do microcrédito em canais on-line, incluindo chats em redes sociais – e oferecer produtos complementares para os microempreendedores, como abertura de conta e maquininhas de cartão.
O banco concedeu R$ 329,22 milhões em microcrédito de janeiro a setembro de 2017. O número representa uma queda de 18,95% em comparação ao mesmo período do ano anterior, mas a instituição afirma que ela está “aderente à estratégia adotada”. Rabelo Junior explica que a queda não significa que eles estão emprestando menos dinheiro, mas que pessoas que entravam na classificação de microcrédito foram realocadas para outras linhas, o que acabou mudando as estatísticas.
“Vínhamos fazendo operação de microcrédito também na agência e percebemos que boa parte desse público poderia ser atendido por outras linhas de crédito”, afirma. A intenção agora é fazer com que o microcrédito, composto apenas de clientes adequados para ela, cresça de forma ainda mais acelerada do que em anos anteriores. Atualmente, o banco conta com 213 agentes, espalhados por 13 Estados e 186 municípios.
Para Alex Araújo, superintendente de microfinanças do Banco do Nordeste (BNB) – responsável por 60% do mercado no segmento -, a crise econômica dos últimos anos desencadeou uma queda da demanda de pequenos empreendedores por crédito, mas já dá sinais mais claros de recuperação no Sudeste. No Nordeste, no entanto, a demanda continua em queda. “A disposição para empreender é reflexo de duas coisas: necessidade e vocação. Era natural que a taxa por necessidade crescesse, mas ela só cresceu quando havia mercado consumidor, e a recuperação do mercado consumidor no Nordeste ainda está retardada”, explica o executivo.
As perspectivas para 2018, contudo, são positivas. O BNB projeta crescimento de 10% no número de clientes, que devem alcançar 12,2 mil pessoas no microcrédito urbano.
A concessão do microcrédito, especialmente para pequenos empresários, é encorajada pelo Ministério do Trabalho e Emprego desde 2005, quando foi instituído o Programa Nacional do Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO). O programa tem o objetivo de “incentivar a geração de trabalho e renda entre os microempreendedores” e, para isso, exige dos bancos que 2% dos depósitos compulsórios à vista junto ao Banco Central sejam destinados para essa modalidade.
Fonte: Valor Econômico