O Relatório de Economia Bancária (REB) do Banco Central (BC) mostrou que a competição – e não o grau de concentração – é a dimensão mais importante para o custo do crédito e dos serviços financeiros para o consumidor. E essa tese pode vir a ser testada com medidas que entram em vigor agora em julho tratando da portabilidade da conta salário e da proibição aos bancos de impedir ou limitar alguns serviços para instituições de pagamento.
Essas mudanças também devem acabar com o mercado e as disputas das grandes instituições financeiras por folhas de pagamento, pois o principal ativo, o relacionamento com os clientes, deixa de ser algo exclusivo. Em agosto do ano passado, por exemplo, o Bradesco pagou R$ 1,3 bilhão para gerir a folha de pagamento do Estado do Rio de Janeiro por cinco anos.
A expectativa do BC com as novas regras é positiva e o Valor apurou que os grandes bancos fizeram diversos questionamentos ao regulador sobre os temas, o que foi interpretado como um sinal de que as mudanças, apesar de simples, estão tirando as instituições tradicionais da zona de conforto. A avaliação é que além de estimular a concorrência, essas ações acabam mexendo na estrutura do mercado, caso das folhas de pagamento, que perdem seu valor.
No caso da conta salário a sistemática adotada foi a mesma da telefonia. O cliente que quer mudar de instituição poderá pedir essa mudança para o novo banco, instituição de pagamento ou fintech (empresa de tecnologia financeira). Até então, o pedido era feito onde ele já tinha relacionamento. A transferência também poderá ser feita para uma conta de depósito. Não por acaso, fintechs como o NuBank anunciaram a abertura de seus sistemas de contas digitais para quem não era cliente ou usuário do cartão de crédito das empresas.
Na mesma linha, os bancos não poderão mais limitar ou impedir as instituições de pagamento de fazer emissão de boletos, transferências entre contas, TEDs e DOCs. E em novembro entra em vigor a vedação a limites ou impedimentos para a realização de débitos em conta autorizados. As ações do BC devem sanar grande parte das reclamações das fintechs, que já ingressaram no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) contra os bancos em função dessas restrições.
O REB também mostrou que as operações de portabilidade de operações de crédito praticamente dobraram no ano passado. Foram efetivadas 2,1 milhões de operações, alta de 93,7% sobre 2016. Em volume, essas transações somaram R$ 16,9 bilhões, alta de 122,2%.
O valor médio do contrato portado ficou próximo a R$ 8 mil, um aumento de cerca de R$ 1 mil. E segundo o BC, esse aumento resulta principalmente da elevação do prazo médio a decorrer, de 42 meses em 2016 para 49 meses em 2017.
Para o BC, uma explicação para tal crescimento da portabilidade está na queda da taxa básica de juros, a Selic. A diminuição da taxa aumentou o espaço para as instituições melhorarem as condições dos contratos, uma vez que as taxas de concessão caíram marginalmente no período.
Essa movimentação, no entanto, continua fortemente concentrada no crédito consignado, que respondeu por 99,9%, do total de pedidos efetivados, e por 99,5% do valor portado. Segundo o BC, por ser um empréstimo, o consignado tem maior agilidade na portabilidade ao não ser vinculado um bem alienado, caso dos financiamentos imobiliários e de automóveis. Além disso, explica o BC, essa característica do consignado facilita a atuação do intermediário financeiro na busca de manter o volume de empréstimo do cliente e, ao mesmo tempo, gerar comissões de intermediação.
Fonte: Valor Econômico