‘Se o varejo pode fazer promoção, banco também pode’, diz diretor do Santander

Alta de rentabilidade do banco coincidiu com mudança no marketing, que agora aborda taxas e preços sem pudor

Antes de assumir o principal cargo do marketing do Santander, Igor Puga era figura conhecida da publicidade, tendo sendo jurado do Cannes Lions – Festival Internacional de Criatividade. Passou por agências como Africa, JWT e DM9 (onde foi vice-presidente de integração e inovação).

No fim de janeiro, houve até explosão no palco no momento em que o presidente do Santander Brasil, Sérgio Rial, anunciou o dado de rentabilidade do banco a funcionários: a marca de 21,1% – só um pouco menos do que o Itaú e acima do indicador do Bradesco – ganhou uma pitada da pirotecnia que caracteriza a comunicação da instituição há algum tempo.

Desde 2016, o Santander bebeu na fonte do varejo e passou a falar de taxas e preços sem pudor. Tornou-se, segundo o diretor de marketing e marca do banco, Igor Puga, o “rei da gritaria”. “Temos de continuar a nos reinventar. E sermos mais ágeis e abusados.”

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

O Santander adotou um marketing bem mais agressivo nos últimos anos. Por quê?

Primeiro, houve uma decisão clara de colocar mais dinheiro em marketing – o salto foi de 50% de 2016 para 2017. E, já que passamos a gastar mais, por que não sermos um pouco mais ácidos? Só aparecer mais não incomodaria. O banco, por ser menor que os concorrentes, passou a ser uma espécie de terceira via mais agressiva – não com os rivais, mas no diálogo com o consumidor. Em uma reunião interna é fácil assumir o discurso de que o banco é um mal necessário, mas é um risco fazer isso em um reclame de 30 segundos, na Rede Globo. Se tivéssemos uma rejeição grande do discurso, não teríamos aumentado nossa carteira de clientes, de crédito e de cartões. Se isso ocorreu, é porque as pessoas de alguma forma se identificaram com o que fizemos.

Como esse posicionamento foi trabalhado na ponta, nas agências?

Porque eu fico tão tranquilo de colocar campanhas na rua que são tão agressivas? Porque elas são de dentro para fora. Essa energia você sente quando entra numa agência, o gerente se sente impulsionado. A gente fez um filme dizendo que ia parar de chamar cheque especial porque isso é hipocrisia – não tem nada de especial, já que é o juro mais caro do mercado. E todo mundo precisa estar preparado para isso. O menino que trabalha no caixa eletrônico tem de saber responder perguntas, porque ele pode ser questionado.

A estratégia começou em 2016. Não atingiu o limite?

Ouvi essa mesma pergunta do conselho um ano depois do início do “O que a gente pode fazer por você hoje?”. No segundo ano, veio de novo. Então, é meio desesperador porque a gente tem de renovar nossa capacidade de provocar o mercado. Antes, a gente se planejava com nove meses de antecedência – agora, temos só três meses de frente, sempre com a ideia de sermos mais ágeis e abusados. Se a gente já é o rei da gritaria, temos de continuar a nos reinventar. Mas não devemos duvidar da nossa capacidade de sermos mais irreverentes e agressivos – até porque concorrentes já começaram a seguir o mesmo caminho.

Nos EUA, as empresas costumam se provocar diretamente. Dá para fazer isso aqui?

Essa prática do mercado americano acaba sendo boa, pois a conversa fica mais sincera – e quem ganha é o consumidor. Particularmente, sou a favor. Tem um limite ético, mas creio que as provocações entre Pepsi e Coca-Cola são positivas, chamam a atenção para o setor de refrigerantes. No Brasil, você não tem coragem nem de fazer uma sutileza porque vai ser condenado e terá de pagar multas. Fica um politicamente correto às avessas, todo mundo usa o álibi da não agressão, da boa vizinhança. Seria mais útil ao consumidor ter algumas verdades sendo ditas.

Quais foram a inspirações da estratégia que o Santander vem adotando?

Sempre houve preconceito de fazer propaganda de banco com taxa, com preço. As pessoas tinham certo nojo, achavam que era coisa de pobre. Mas o consumidor quer isso, alguém que chegue e diga: baixamos a taxa de crédito imobiliário para tanto. As nossas referências são de varejo. Fizemos uma Black Week. Há três anos, isso era piada – e a gente foi lá e contratou o garoto-propaganda da Casas Bahia, aquele que todo mundo odeia. Mas o efeito foi o contrário. Se o varejo pode fazer promoção, eu também posso.

O mercado brasileiro é bastante concentrado, mas as fintechs estão ganhando espaço. Como enfrentar esse novo rival?

A euforia com as fintechs no Brasil é um pouco descabida. Não quer dizer que elas não roubem mercado, especialmente em investimentos. Mas o brasileiro tende a optar pela conveniência de resolver todos os problemas num só banco. As fintechs pressupõem uma relação financeira mais madura, de pulverizar cartão de crédito, investimento, fundo de previdência. Além disso, toda a vez que uma fintech fica muito forte em determinada área, acaba comprada por um banco. Mas elas mostram certas coisas para o setor: dá para ser mais ágil, dá para ser mais barato.

Mas o Santander está criando uma corretora…

É a PI. A gente escolheu esse nome porque quem é sofisticado entende o símbolo pi e, para os demais, a sigla será traduzida como “Para Investir”. O banco está diversificando negócios – tem a financeira Olé, a Webmotors, a GetNet. A PI vai ser lançada em breve. Tudo depende apenas de algumas questões regulatórias.

Outra tendência dos bancos são os organizadores financeiros embutidos nos apps.

É uma tendência irreversível. Vamos lançar, em dez dias, uma nova ferramenta no app do Santander. Hoje, os bancos oferecem algo parecido com o Guia Bolso, que é a página um do problema. Demos um passo a mais. Teremos o radar do CPF dos nossos clientes – vamos mostrar se ele está regular com a gente, no Serasa e em outros bancos. É orientação financeira de verdade: sei que você está devendo no Magazine Luiza e te ofereço empréstimo. O sistema dos bancos é interligado – e deixar isso transparente para o consumidor é maluquice. Mas, sem contar para ninguém, só subindo a ferramenta no menu do app, já tivemos 900 mil acessos.

Fonte: Estadão